Desrespeito a interdições do MTE acaba em prisão

Por Bianca Pyl

Espanhola Acciona responde por obras do Data Center do Santander (Foto: Fernanda Forato)

Combinado com a permanência de problemas apontados em inspeções anteriores, o desrespeito às interdições feitas pelo MTE acabou resultando na prisão do engenheiro espanhol Raul Jurado Pozuelo, da Acciona Infraestructuras, empresa responsável pela construção do Centro de Processamento de Dados (Data Center) do Banco Santander em Campinas (SP), no interior do Estado do São Paulo.

A prisão ocorreu no dia 10 de fevereiro deste ano e foi executada pela Polícia Federal (PF). O engenheiro foi enquadrado nos crimes previstos nos artigos 132 (expor a vida ou a saúde de outrem em risco direto e iminente) e 205 (exercício de atividade com infração de decisão administrativa) do Código Penal brasileiro.

Raul foi solto no mesmo dia pelo delegado da PF, Paulo Martinelli, após pagar fiança de R$ 3 mil, e responderá a inquérito pela ocorrência. Em março, após o episódio do encarceramento do engenheiro espanhol, o Banco Santander assinou um acordo, proposto pela PRT-15, comprometendo-se a alterar o cronograma de entrega da obra e a regularizar a jornada de trabalho dos operários, inclusive dos terceirizados. A Acciona, de origem espanhola como o Santander, celebrou outro Termo de Ajuste de Conduta (TAC), assumindo obrigações quanto à jornada, saúde e segurança do trabalho.

A inspeção que culminou com a prisão do engenheiro da Acciona foi a terceira no mesmo canteiro. Problemas apontados já na primeira fiscalização – acompanhada pela Repórter Brasil e realizada mais de quatro meses antes da terceira  – não só não tinham sido resolvidos, como novas irregularidades foram constatadas. Já na primeira checagem, em setembro de 2011, servidores do MTE interditaram andaimes e lavraram, no total, 46 autos de infração.

Auditores fiscais e procuradores do MPT voltaram ao local no dia 31 de janeiro deste ano para uma segunda averiguação. Foram, então, interditados equipamentos e tarefas no canteiro de obras, entre elas quatro gruas, guindastes e a atividade de solda. Contudo, ao longo da mesma semana, a interdição foi desrespeitada. A auditora retornou às obras no dia 2 de fevereiro e verificou que os equipamentos estavam funcionando. “As pessoas continuavam a ser içadas com guindastes para chegar aos pontos mais altos da construção”, explica a auditora Márcia Marques, que participou da fiscalização.

Quando voltaram ao canteiro de obras do Data Center do Banco Santander pela terceira vez, Márcia e João Batista Amâncio atestaram que um trabalhador acabou sofrendo um acidente ao utilizar o guindaste outrora interditado. Na época da primeira vistoria,a obra contava com cerca de 450 trabalhadores. Na última, já possuía mais de 700.

Além de risco de vida, os trabalhadores eram submetidos a jornadas prolongadas, algumas de até 17 horas por dia. De acordo com os auditores, operários passaram mais de dois meses sem folgar, trabalhando de domingo a domingo.

Em 28 de dezembro de 2011, o MTE interditou também um alojamento utilizado por operários da mesma obra, contratados pela “empresa” Carlos Eduardo da Conceição (CEC) para a prestação de serviços de alvenaria. O local estava completamente superlotado, com 20 migrantes vindos do Rio de Janeiro. Um trabalhador chegou a dormir dentro do guarda-roupa. Improvisadas, algumas “camas” estavam instaladas na varanda da casa, que só possuía um cômodo.

Outros alojamentos de operários da mesma obra foram vistoriados pelo Centro de Referência em Saúde do Trabalhador (Cerest) e pela Vigilância Sanitária de Campinas (SP). Segundo Alexandre Polli Beltrami, coordenador adjunto do Cerest, não houve interdições nas primeiras visitas, mas as empresas terceirzadas pela Acciona receberam notificações para a correção de irregularidades, como a superlotação e a falta de higiene.

Uma das subcontratadas que mantinha alojamentos (Teccal), aliás, deixou de prestar serviços à Acciona e alegou, em audiência na PRT-15, que não tivera como honrar a rescisão dos trabalhadores porque a Acciona não havia repassado recursos previstos em contrato.

Procurada pela reportagem, a Acciona não se pronunciou sobre a sucessão de irregularidades. Em nota, a assessoria de imprensa do Banco Santander informou “que foi comunicado pela construtora responsável da obra, Acciona, que todas as correções demandadas pelo Ministério Público do Trabalho já foram sanadas”. “Diante disso”, emendou, “a construtora está agendando nova visita do MPT ao canteiro de obras para constatação das melhorias implantadas”.

Continuação:
1. Profusão de obras acentua carências e despreparo
2. Terceirizações ilegais estão na base dos problemas
4. Operários sem treinamento correm risco de morte
5. Libertações sucessivas são realizadas em canteiros

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