Por Fabiana Vezzali
Há disputas entre turmas de cortadores de cana; “campeões” são premiados (Foto: Arquivo/RB)
É praticamente impossível falar em cana-de-açúcar sem levar em conta as reivindicações dos cortadores por melhores condições de trabalho em um setor conhecido pelo desgaste físico e pela superexploração das energias dos empregados da cana.
“Os trabalhadores ganham por produção. Quanto mais o trabalhador produzir, mais ele vai ganhar. Hoje, para atingir o salário base ele tem que cortar 3 toneladas e 300 quilos. Acima de 3,3 toneladas, ele ganha pelo percentual. Hoje tem turma que chega a cortar 10 toneladas”, conta Raimundo Nonato Moura, outro dirigente sindical local. Há premiação para quem corta mais. “A turma campeã do mês ganha uma cesta básica. E termina sendo uma disputa de turma para poder trabalhar mais, para poder ganhar essa premiação”.
Em julho de 2011, foi firmado novo acordo coletivo entre a usina e os sindicatos de União (PI), José de Freitas (PI) e Teresina (PI), municípios de origem de parte dos funcionários. Há ainda os cortadores vindos do Maranhão. “O acordo teve avanços. Conseguimos novas condições de trabalho para aqueles que aplicam herbicidas, por exemplo. O trabalhador vai aplicar agrotóxicos por 90 dias e terá um intervalo de 45 dias, em que irá se dedicar a outra atividade. No ano seguinte, não trabalhará com agrotóxicos”, explica Laurentino. Ele também destaca a diminuição das distâncias em que o cortador deve carregar a cana nos braços para depositá-las nos montes que são transportados pelas máquinas. “Será a partir de 2012 e deve ajudar a diminuir o desgaste físico”, afirma.
Entre as principais reivindicações para melhorar as condições de trabalho dos cortadores está o aumento do salário-base dos cortadores, pouco acima do salário mínimo. Em Goiás, compara Laurentino, o salário base na carteira do cortador de cana em 2011 era um pouco maior (R$ 667). “Está distante do que temos no Piauí”.
Ainda na década de 80, Antonio Osmar trabalhou no garimpo e em propriedades de criação de gado bovino no Pará. Em uma fazenda de pecuária naquele Estado, enfrentou condições que caracterizam a escravidão contemporânea e se viu obrigado a fugir do local em que foi levado para roçar. “Era nós trabalhando e oito pistoleiros com rifle acompanhando. A gente almoçava e voltava para o serviço, ainda mastigando. Trabalhava até enquanto estivesse dia. Saímos de lá fugidos, de meia-noite para 1h da manhã. A fazenda toda era ‘murada’. Eu pulava nas folhas para não deixar rastro porque eles iam atrás para matar mesmo. Vi tanta caveira de gente”.
Nos 17 anos em que corta cana, passou por diferentes Estados brasileiros. Além de Mato Grosso e Alagoas, também esteve no Maranhão. Depois de tantos anos como cortador, acumula as dores constantes no corpo em decorrência do esforço físico. Depois de mais uma temporada como cortador em União (PI) em 2011, esperava receber a rescisão trabalhista e o Seguro-Desemprego até a próxima poda chegar, em julho deste ano. Para outros cortadores da região que conseguiram manter pequenos cultivos, a roça plantada com a família costuma ser a garantia de subsistência no período entre as safras.
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